
NETFLIX WARner
- Vera Zaverucha

- há 13 minutos
- 3 min de leitura
A notícia da aquisição da Warner Bros. pela Netflix por US$ 82,7 bilhões ilustra um cenário de concentração extrema de mercado que torna urgente e crítica a regulação do setor no Brasil, atualmente debatida no PL 2331/2022 (e seu correlato na Câmara, o PL 8889/17). A "péssima regulação" — ou a lentidão e timidez em aprová-la — deixa o mercado audiovisual brasileiro vulnerável a um novo gigante global que detém não apenas os canais de distribuição, mas agora um dos maiores acervos de propriedade intelectual do mundo.
Abaixo, apresento uma crítica baseada nos principais pontos de atrito entre essa movimentação de mercado e a realidade legislativa brasileira:
1. Assimetria Tributária e a "Condecine Tímida"
Enquanto a Netflix consolida um império de quase 100 bilhões de dólares, o debate no Brasil ainda gira em torno de alíquotas de Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional) consideradas irrisórias por parte do setor independente.
A Crítica: O PL 2331 tem sido criticado por propor alíquotas (em torno de 3%, podendo cair para 1,5% com atenuantes) muito abaixo das praticadas em outros setores do audiovisual (como a TV paga) ou em mercados europeus. Com a fusão, a nova "Netflix-Warner" terá um poder econômico desproporcional, e uma tributação baixa significa que essas big techs continuarão explorando o mercado consumidor brasileiro massivamente sem devolver uma contrapartida justa para o fomento da produção local.
2. A Morte da Propriedade Intelectual Brasileira
A notícia cita a estratégia da Netflix de "construir, não adquirir", que agora muda para uma aquisição agressiva. No Brasil, o modelo de negócios das plataformas de VOD (Video on Demand) opera majoritariamente no sistema de work for hire (encomenda), onde a plataforma paga pela produção mas retém 100% dos direitos patrimoniais (Propriedade Intelectual).
A Crítica: Sem uma regulação que obrigue a retenção de parte dos direitos para os produtores independentes brasileiros (como sugere parte do setor produtivo nas discussões do PL), as produtoras nacionais viram meras prestadoras de serviço. Com a fusão, a Netflix ganha ainda mais poder de barganha para impor contratos leoninos, impedindo que o Brasil crie um patrimônio audiovisual próprio que possa ser monetizado no futuro.
3. Visibilidade e Soberania Cultural (Cotas)
A fusão concentra franquias globais (Harry Potter, DC, Game of Thrones) e originais Netflix em um único aplicativo.
A Crítica: Sem cotas de tela robustas e regras de proeminência (obrigação de dar destaque ao conteúdo nacional na interface) definidas no PL 2331, o conteúdo brasileiro corre o risco de desaparecer nos algoritmos. A "péssima regulação" é aquela que não garante que o assinante brasileiro sequer veja a produção do seu próprio país em meio a um mar de conteúdo estrangeiro agora unificado sob uma única gigante.
4. Ameaça à Diversidade e aos Pequenos Players
O texto do PL 2331 e as discussões no Congresso sofrem forte lobby das big techs para reduzir obrigações.
A Crítica: A fusão Netflix-Warner cria um ente com poder quase monopolista. Uma regulação fraca permite que esse ente dite preços, sufoque concorrentes menores (como o Globoplay ou plataformas de nicho) e homogenize a cultura. A falta de travas regulatórias contra a concentração vertical (ser dono do estúdio e da plataforma) repete os erros que os EUA tentaram evitar no passado com a Lei Paramount, mas que o Brasil parece ignorar ao deixar o mercado se autorregular.
Em suma, a transação bilionária reforça que o Brasil não pode mais tratar a regulação do VOD como uma questão menor ou meramente tributária; trata-se de defesa da soberania cultural e econômica diante de conglomerados que operam com orçamentos superiores ao PIB de muitos países.
Vera Zaverucha


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